Aterapia: "A adolescência atual: uma travessia em ato"
Hoje abrimos espaço para que nosso patrocinador e contribuinte Aterapia converse com vocês. O texto foi escrito pela psicóloga Maria Eduarda Simonsen e é possível acessá-lo pelo site (link externo) da Aterapia.
A adolescência atual: uma travessia em ato
Pandemia e isolamento social. Afastamento abrupto dos amigos e da rotina. Nesse cenário, as especificidades de nossa sociedade, quando comparadas com as sociedades tradicionais, tornam-se mais evidentes. Mas qual seria a relação entre a adolescência e a sociedade contemporânea?
Nas sociedades tradicionais, a passagem da infância para a vida adulta era realizada por meio de ritos, o que não ocorre atualmente. Sem os ritos e diante da falência dos ideais da infância, o adolescente não encontra facilmente, no meio social contemporâneo, referências estáveis capazes de fornecer modelos à construção da “nova” identidade. Esse desamparo favorece a passagem ao ato.
A passagem ao ato diz respeito a um excesso de energia psíquica que sem ser simbolizada é descarregada diretamente em ato. São comportamentos disruptivos, em que o adolescente desconta no corpo o que simbolicamente lhe escapa. Cortes, por exemplo, são uma tentativa de inscrição simbólica. É comum ouvirmos comentários como: “Me corto porque estava angustiada, depois melhora um pouco.” e “Não sei o que me leva a fazer isso, mas depois fico mais calma.”. Infelizmente, passar dos cortes ao suicídio é um caminho para muitos jovens. Apesar de ainda ser um tabu, as estatísticas apontam que o suicídio entre os jovens só cresce ano a ano.
A adolescência é justamente o momento em que o sujeito se depara com importantes perdas, devendo realizar um forte trabalho de luto: luto do corpo infantil, luto dos pais idealizados, luto do amor dos pais. Em “Luto e Melancolia” (1917[1915]), Freud nos mostra que, ao contrário do luto, a melancolia é uma reação patológica frente à perda. Vivendo em uma sociedade extremamente narcísica e movediça, os jovens têm dificuldades para realizar o luto necessário da infância para o ingresso na vida adulta. Muitas vezes, a não realização adequada do luto faz com que os adolescentes reajam como o melancólico de Freud.
Os casos de suicídio pós bullying são bons exemplos para possíveis efeitos do comportamento melancólico. Ao ser violentamente assediado, o jovem perde o controle imaginário que tem de seu corpo, sente-se narcisicamente destituído, sem valor. Em consequência, vê no suicídio a única maneira de acabar com o sofrimento. Não é difícil concluir que os laços intersubjetivos violentados mais o sentimento irremediável de fracasso têm relação direta com a forte progressão do suicídio entre os jovens.
A sociedade atual obriga o adolescente a recriar modos de inserção social, para além da família, sem ajudá-lo no processo. Em uma sociedade instável, cujos modelos de autoridade são continuamente enfraquecidos, esse remanejamento torna-se cada vez mais penoso. Nós - profissionais da saúde, pais e educadores - precisamos estar atentos para os comportamentos dos jovens enquanto pedido de socorro. Só assim poderemos ajudá-los nessa travessia chamada adolescência.
Autoria: Maria Eduarda S. P. Simonsen
Imagem 2: Full, 2010 (da série Esculturas Gráficas); Madeira de balsa, MDF e acrílica; Dimensões variáveis; Coleção do artista José Bechara. Vista da exposição “Full” na Galeria Marília Razuk, São Paulo. Registro fotográfico: Everton Ballardin
Se interessou? Acompanhe a ATERAPIA pelas redes sociais! ;)
Instagram: https://instagram.com/aterapiaparavoce (link externo)
Facebook: https://www.facebook.com/aterapiaparavoce/(link externo)
Site: https://aterapia.com.br/ (link externo):